sábado, 20 de novembro de 2010

DEUS é DEUS.

Há uma infinidade de ideias sobre Deus, ou sobre os deuses. A maior parte delas vem do pensamento íntimo de cada pessoa; a outra parte é extraída de corpos de doutrina baseados em supostos contatos diretos entre certos seres humanos e certos deuses. Exemplo, Moisés teria recebido diretamente da divindade nomeada Javé, ou Jeová, a tábua de pedra com a gravação dos Dez Mandamentos.

Entre as igrejas cristãs, há uma, brasileira e evangélica, que se identifica por um slogan : “Deus é Fiel”. Isto não é nada lisonjeiro para Deus, uma vez que fidelidade (lembro do termo corrente, “fidelidade canina”) implica em subserviência. A julgar por esse parâmetro, Deus seria subserviente aos membros da tal igreja (ou talvez, aos pastores, membros privilegiados da tal igreja).

Essa ideia de que Deus é subserviente, quebra-galhos, versão desimaginativa do Gênio da Lâmpada, é muito comum. Assim, Deus serve para “ficar do nosso lado” quando atribuímos a nossos adversários, ou a pessoas que nos contrariem em algum ponto, o epíteto de Agentes do Mal, sendo esse Mal o outro deus da mitologia cristã (ou melhor, cristã-maniqueísta), Lúcifer. É claro que se formos lá e matarmos um Agente do Mal, "Deus" dará todo o apoio, pois tudo o que esse "Deus" quer é tornar-se Absoluto, o que é impedido, pelo menos por enquanto, pelo tal Príncipe das Trevas. Esse maniqueísmo cristão tem justificado todas as guerras e matanças dos últimos 1700 anos (ou seja, do período que sucede à conversão de Constantino)...

Na minha opinião, Deus é Absoluto. E Único. Lúcifer, ou Mal, ou nomes equivalentes, são bons nomes para darmos às nossas ignorâncias, ao nosso não-saber. Inferno é um lugar para onde podemos mandar, metaforicamente, nossas burrices e incompreensões, pessoais ou coletivas.

Podemos pensar que Deus é Absoluto, mas na verdade dele nada sabemos, nem mesmo se é um ser ou um processo. Imagino, por poesia e conveniência, que seja um ser. Imagino que ele fez o mundo como o mundo é, e depois se sentou (onde? como?) para observar. Imagino que ele não interfere nas ações dos seres, humanos ou não, existentes no Universo. Mas, contraditoriamente, imagino que de vez em quando ele abre uma exceção e me dá uma ajudazinha maneira naquela situação crítica em que me meti. Não imagino que ele vá prejudicar alguém só para me beneficiar, pois isto implicaria em subserviência de Deus à minha pessoa, o que é evidentemente absurdo. Parafraseando aquele irmão Marx (Groucho) não respeito um Deus que sempre me dá razão (isto é tarefa de mãe).

Imagino que Deus tem acesso a todos os seres do Universo, e portanto também a todos os seres humanos. Assim, Deus não precisa de intermediários (quem precisa de intermediários são as mercadorias, para chegar do produtor ao consumidor). Imagino que Deus sabe falar, ler e escrever. E teria escrito um livro sagrado se assim o tivesse desejado. E esse livro sagrado (com upgrade permanente em suas inumeráveis adaptações à diversidade linguística humana) seria entendido por todos, sem contradições e sem guerras religiosas, uma vez que bom escritor é aquele que as pessoas entendem diretamente, e não aquele que precisa de milhões de intérpretes para ser “entendido”. Mas Deus não escreveu nenhum livro sagrado; ele nos deu muito mais do que um livro sagrado: nos deu neurônios, bilhões deles, mais do que suficientes para sempre acharmos, embora às vezes com atordoantes demoras, o melhor caminho para o progresso, a paz e a felicidade.